domingo, julho 9

Não me inveje, trabalhe! (no vidro do carro do Lula)

ELIO GASPARI
No ano que vem Nosso Guia vira milionário

Por que Paulo Okamotto quitou dívida de R$ 29.436 de Lula, se ele tinha R$ 150 mil no banco, rendendo juros?

A APOTEOSE PATRIMONIAL de Lula, cujo ervanário passou de R$ 423 mil em 2002 para R$ 839 mil (um crescimento de 98%), é um monumento ao privilégio, à gulodice e à soberba. Reeleito, Lula se transformará num declarado milionário lá pelo segundo semestre do ano que vem. Nosso Guia enriqueceu em 2003, quando decidiu acumular a pensão de R$ 3.862 do Bolsa-Ditadura que recebe desde 1996, com o salário de presidente da República (R$ 6.830 líquidos).
Lula tinha 51 anos quando aliviou seu orçamento com o Bolsa-Ditadura, por conta da perda de um mandato sindical e de 51 dias de cadeia, sofridos em maio de 1980. Para colocar a ditadura no seu devido lugar, vale lembrar que nessa época o AI-5 já fora ao lixo e o presidente João Figueiredo sancionara a Lei da Anistia. Leonel Brizola e Luiz Carlos Prestes (PCB) já haviam voltado ao Brasil. Lula fundara o PT em fevereiro. Nosso Guia achou que tinha direito a um conforto e a lei lhe deu razão.
No dia 1º de janeiro de 2003 o bolsista tornou-se presidente da República, com salário, casa, comida roupa lavada, carro na porta e avião na pista. Tinha um patrimônio formado por três apartamentos, um terreno, um carro e R$ 117 mil rendendo juros. Cabia-lhe decidir se acompanhava a tradição, tomando à bolsa da Viúva tudo a que tinha direito. (Os generais acumulavam proventos resultantes de pelo menos 30 anos de serviço. Num cálculo grosseiro, recebiam cerca de R$ 20 mil mensais. FFHH, somava uma Bolsa-USP, perfazendo uns R$ 12 mil.)
Neste mês, como parte dos festejos do veto que seus ministros ameaçam impor ao acesso das empregadas domésticas ao FGTS (benefício que sempre recebeu), Nosso Guia ganhou um aumento de 5% na pensão. Sua aposentadoria especial passou para R$ 4.508 mensais. Estimando-se que a vida lhe custe apenas R$ 3.000 por mês, e que poupe R$ 8.000, Lula conseguirá seu primeiro milhão de reais no segundo semestre do ano que vem. (Essa conta inclui o dízimo petista, despesas de condomínio, limpeza, luz e telefone em São Bernardo. Fica à vontade do freguês uma estimativa com as despesas de vestuário.)
O sindicalista que até 2002 aplicou seu dinheiro em tijolos, como fazem quase todos os trabalhadores brasileiros, mudou de turma. A parte de seu patrimônio diretamente relacionada com a produção e o emprego (três apartamentos e um carro) equivalia a 62% do ervanário. Suas aplicações na taxa de juros somavam R$ 117,5 mil (28%). Passados quatro anos, inverteu sua relação com a economia nacional. Assim como os barões do café do final do século 19 e os marqueses da estagnação do 21, aninhou-se em negócios baseados nos juros da dívida pública. É lá que estão R$ 474,6 mil, 56% do patrimônio-companheiro. Com uma diferença: agora quem faz a dívida é seu governo. A cada mês ganha mais como bolsista-rentista do que como presidente. Não se diga que Lula é incapaz de investir na produção de uma empresa, pois pingou R$ 1.800 em ações da Petrobrás.A apoteose patrimonial de Lula sugere uma pergunta: Por que aceitou que Paulo Okamotto, tesoureiro de suas campanhas em 1994 e 1998, pagasse com dinheiro próprio uma dívida de R$ 29.436 cobrada pelo PT, no cumprimento da Lei Eleitoral? O doador universal não estava tão abonado assim. Dividiu a fatura em quatro prestações, entre dezembro de 2003 e março de 2004. Nessa época Lula tinha uns R$ 150 mil na banca.
Recordar é viver. Em 1960 a Força Aérea criou a patente de marechal-do-ar. O brigadeiro Eduardo Gomes, duas vezes candidato à Presidência (1945 e 1949), opunha-se à medida. Achava-a errada, e não queria deixar de ser "o brigadeiro".Suportou o marechalato sem dizer uma palavra. Em 85 anos de vida, Eduardo Gomes falou menos que Lula numa semana. Depois de sua morte, em 1981, soube-se que a cada mês, ao receber o salário de marechal, calculava quanto ganharia se continuasse a ser brigadeiro. Fazia um cheque com a diferença e remetia-o a alguma instituição religiosa. No Rio, ajudava um orfanato.

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