quinta-feira, agosto 10

O honesto de Rondônia

Para alegrar sua manhã, um texto com muito humor. Pode ler também aqui, se for assinante da Folha ou do UOL.
Réquiem para HD

Clóvis Rossi
Folha de São Paulo

Há um Honesto Desconhecido, doravante tratado por HD, à solta por aí. Mais exatamente, em Rondônia. É o único dos 24 deputados estaduais não acusado de trambiques. É tamanha a podridão no país tropical que conseguiu violentar uma das regras fundadoras do jornalismo. Jornalismo é, na essência, o relato da anomalia. Notícia é avião que cai ou atrasa muito, não aviões que decolam e pousam mais ou menos no horário, aliás a avassaladora maioria. Em Rondônia, a avassaladora maioria dos deputados é trambiqueira, mas, mesmo assim, os nomes dos 23 saíram no jornal. O da anomalia, o honesto desconhecido, ficou no anonimato. Consta até que está cadastrado no Ibama, como espécime ameaçada de extinção. Receberá, quando seu nome for conhecido, pulseirinha com a inscrição "político honesto 0001". O fabricante das pulseiras avisa que descontinuou a produção. Falta demanda. O anonimato protege as crianças de HD. Já imaginou a reação dos coleguinhas ao verem chegar os filhos da anomalia? "Ói, lá, o filho do honesto", dirão, escandindo as palavras como antigamente se fazia com "filho da puta". Protege também a mulher do indigitado. Poupa-a do vexame de, ao entrar no cabeleireiro, ser recebida com olhares irônicos das mulheres dos 23 trambiqueiros e com a dúvida da dona do salão: "Mulher de honesto tem dinheiro para pagar pelo menos a unha?".
HD disfarça-se para freqüentar seu local de trabalho, a Assembléia Legislativa. Um colega, outro dia, disse-lhe que não poderia mais tratá-lo como "excelência". Emendou: "Sua honestidade é uma vergonha para a categoria". HD pensa em pedir asilo. De cara, descartou Brasília. Mas está difícil encontrar-se em qualquer ponto do Brasil. É um aleijão. Agride a "normalidade" da pátria.

Nenhum comentário: