terça-feira, maio 9

As brechas da lei

Como praticar crime dentro da lei

Frei Betto

Grand Canyon Landscapes - Masterpieces
by master painter Fred Lucas

"É ilegal sonegar impostos. Mas quem gosta de pagá-los? Eu não.
Ocorre que muitos não gostam ou não podem pagar impostos: narcotraficantes, contrabandistas, terroristas, e também empresas e empresários. Ou seja, aqueles que engordariam ainda mais os cofres públicos. Agem à sombra da lei. Não é o fato de ficarem impunes que me surpreende, e sim o de contarem com toda uma estrutura legal para praticarem ilegalidade: paraísos fiscais, jurisdições sigilosas, doleiros, cobrança de preços por transferências, empresas de fachada, fundações anônimas, contas secretas, mecanismos de remessa de dinheiro ao exterior etc. O capitalismo, além de injusto, é o mais cínico dos sistemas sociais.
Para quem trabalha duro, o peso da lei. Para quem acumula fortunas, as brechas da lei. Cristovam Buarque, em conversa com George Soros, o maior especulador do mundo, indagou-lhe se não se envergonhava do que fazia. Ele respondeu: "Jamais violo as leis dos países em que opero. Descubro as brechas de sua legislação e, assim, atuo."
O que move pessoas, físicas e jurídicas, a estocarem tanto dinheiro? Quanto aos bandidos, o mesmo que levava os piratas a aportarem na Ilha do Tesouro (hoje, Ilha da Juventude), em Cuba, onde enterravam suas arcas repletas de produtos dos saques.
Os empresários e governos a buscarem "maximizar os lucros", eufemismo para justificar práticas antiéticas, injustas, extorsivas e abusivas, penalizando duramente os mais pobres.
Se Kofi Annan, presidente da ONU, está preocupado com a corrupção nos países em desenvolvimento, como expressou diante de Lula em Salamanca, deveria dotar o organismo internacional de poder para fechar os paraísos fiscais. Por que os ricos do mundo merecem ilhas de sonegação legal? E obrigar o sistema bancário internacional a eliminar as contas secretas ou sigilosas." Leia o texto completo aqui.
Mas não é sòmente para o escancarado roubo financeiro que existem as brechas da lei. O caso do réu confesso da morte da ex-namorada, jornalista Pimenta Neves, 69 anos, brada aos céus. Dizem que ele terá até 2 anos para recorrer da pena de 19 anos, em liberdade. E dizem determinados advogados que ele nunca será preso.
E eis a mais recente incursão nas brechas da lei: STF suspende apuração do MP sobre suposta ligação de Dirceu com Santo André. O ministro Eros Grau, do STF (Supremo Tribunal Federal), concedeu nesta terça-feira (9/5) uma liminar que obriga o MP-SP (Ministério Público de São Paulo) a suspender a investigação criminal que apura o suposto envolvimento do ex-deputado José Dirceu e de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no desvio de recursos da Prefeitura de Santo André, durante a administração do petista Celso Daniel.
Está proibido investigar trambiqueiros. E quando são investigados, conseguem habeas-corpus para não falarem se acharem que isso será usado contra eles. É o Grand Canyon da lei.

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